sábado, 7 de agosto de 2010

TERRA EM TRANSE: UM DELÍRIO POÉTICO-POLÍTICO


André Leite Ferreira



Fanatismo ditatorial, política tropical, o povo vive da fé e da esperança. A poesia da fome, a loucura da arte, a desordem convulsa do panurgismo, uma leitura do poder na idade média e que ainda insiste até hoje com outras mascaras, mas o político continua representando a nobreza de outrora, a igreja vem em seguida mostrando o lugar do povo, é a figura do padre, o pastor cuidando das ovelhas, por fim o povo, sustentáculo de toda a farsa. Um frenesi do delírio do poder político, do senso de dominação sobre as massas de ignorantes alegres, que sempre se contentam com qualquer festa.

Uma poética armada de caos e loucura, delírio incondicional de um país a beira de um ataque de nervos. Eldorado pode ser uma ficção, mas a America Latina não. Ditaduras, torturas, desaparecidos, burguesia, luta de classes, guerrilha, uma terra que vive em transe, cheia de tensões e conflitos. Poetas e loucos se confundem, ou melhor, se fundem em uma tensão existencial levada ao extremo, o povo sempre uma incógnita que às vezes reage com a não ação, aí não se entende mais nada, já que aqui tudo parece terminar em carnaval, um retrato peculiar da cultura e da política tropical.

Na America Latina das ditaduras e do caos, impossível não fazer uma leitura política do filme “Terra em Transe”, porém este filme carregado de alegorias e delírios deixa em evidência uma estética preconizada por Glauber, esta estética, era exatamente a chamada “estética da fome”, que mostrava então o retrato do subdesenvolvimento latino americano, além disso, o cinema novo buscava criar novos olhares e formas de se fazer cinema, que se diferenciassem do cinema industrial-comercial.

O filme “Terra em Transe” mostra o conflito existencial e político do Poeta-jornalista Paulo Martins, que ora se encontra ligado ao político conservador Porfírio Diaz, porém depois que este se torna senador, o poeta se afasta e vai para a província de Alecrim, onde conhece Sara e juntos passam a apoiar o populista Felipe Vieira. O poeta então passa a vivenciar um conflito existencial e acaba retornando a Capital. O povo é retratado como uma “Maria vai com as outras”, e nesta loucura e delírio, tudo acaba em carnaval, em uma grande orgia, onde por fim morre o poeta e seu idealismo e ascende à ditadura e a megalomania ao poder, submetendo a todos o seu terror.

Este filme produzido em 1967 pode ser visto e lido como um retrato da miséria não só do Brasil, mas da America Latina subdesenvolvida de ontem e de hoje, já que a nossa história é uma história de saques, invasões e todo tipo de arbitrariedades, causadas pela imposição primeiro dos colonizadores, e em seguida por seus generais, burgueses e imperialistas que sempre nos submeteram a suas dominações, a ferro e fogo, ou seja, as ditaduras por aqui nunca acabaram antes eram as fardas, agora são ditaduras civis, disfarçadas, como dizia o próprio Glauber “É preciso arrancar as mascaras”, e ir além.


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