sexta-feira, 25 de março de 2011


ÓDIO ILETRADO

Fernando Campos
            O Estado sempre esteve preocupado em controlar o comportamento da sociedade. Esse insidioso empreendimento conta com duas das mai eficientes ferramentas disponíveis: A educação e os meios de comunicação.
            A educação funciona como um condutor ideológico para incultir a ideia de uma sociedade democrática trabalhada pela autoridade política (escolhida pela maioria de um grupo) amparada por um sistema econômico que oferece oportunidades iguais. Entretanto, como classifica-se esse modelo de DEMOCRACIA extratificado: ricos e pobres (Aristóteles), os grandes e povo (Maquiavel), as classes sociais antagônicas (Marx)? Muito embora, se ignore que a política liberal (que culminou com esse abominável neo-liberalismo contemporâneo) é resultado de eventos econômicos e sociais que atribuiu transformações na concepção do poder do Estado, deve-se aunência dos indivíduos por intermédio do Contrato Social.
            Os meios de comunicação promovem a imagem desse sistema. Gravam no inconsciente coletivo arquétipos definitivos. Imutáveis. O imaginário o indivíduo deslumbra-se com um paraíso de possibilidades. Fornece a maquette do “Sonho artificial”. Anestesia os sentidos causando uma disfuncionalidade da consciência que bloqueia a compreensão dos eventos. Isso gera um alheamento do indivíduo das questões coletivas, pois o conceito de realidade foi totalmente obliterado no processo.
            Considere-se, também, outras duas ferramentas imprescindíveis para o eito absoluto da ação do Estado. As religiões que procuram, dopar o indivíduo por vias “espirituais” e convencê-lo a aceitar de forma resignada a exploração da numerosa classe baixa em sua patética expressão de apatia e condescendência. E finalmente a Máquina Repressora que legitimiza a violência para extinguir (com a Morte) o menos sinal de insurreição.
            O filme-denúncia de François Truffaut, Fahrenheit 451, alegorizava um sombrio futuro. Um pesadelo sobre Estados totalitários e políticas autoritárias. O roteiro foi baseado o romance homônimo de Ray Bradbury que declarou que o conteúdo do livro não tratava-se de um libelo contra a censura e sim de uma constatação óbvia a qual ele chegou ainda quando jovem. Com o advento da comercialização da televisão e com a ampliação do alcance comunicativo desse objetivo destruiu-se o interesse pela leitura.
            No filme, que tranpôs finalmente o conteúdo do romance, apresenta um futuro onde livros são proibidos. Sustentar opinião própria é uma afronta e crime contra o Estado que mantém uma política violenta de supressão do pensamento crítico. Nesse sentido como os livros são portadores de conhecimentos e emoções e ISS pode conduzir o indivíduo a ter uma revelação e levá-lo a ações reativas. As autoridades criam um tipo especial de “bombeiro” que inverte a ordem da função original de um bombeiro: APAGAR O FOGO. Tanto no filme, de Truffaut, quanto o romance de Ray Bradbury, os agentes do estado representado pela figura do bombeiro que carregam um lança chamas: INCENDEIA OS LIVROS. O número 451 refere-se à temperatura – Fahrenheit – a qual o papel (ou livro) incendeia-se.
            Muitos espectadores costumam julgar como ignorante a ação do Estado quanto a atitude de banir os livros através de sua cremação. Entretanto, as pessoas reservam fins, até, bem mais inglórios para os livros. Confinamos em bibliotecas sob o silêncio sagrado de uma catedral, onde o único som que é produzido (que é quase imperceptível) representa a presença do único ser realmente interessado  nos livros naquele ambiente: a térmita.
            É interessante considerar a simbologia do conteúdo do filme. As pessoas migram para aterra dos livros. Elas se submetem a necessidade de ler e memorizar os livros para reescrevê-los depois. Logo percebe-se o retorno a origem narrativa: a oralização. E depois pela urgência de se fazer hábito a leitura cotidiana como num exercício de resistência aos meios de comunicação de massa que, a despeito de sua utilidade, desVIRTUAM o poder mágico da palavra.
            No livro, Crisântempo, do poeta concretista Haroldo de Campos, um poema expõe essa triste crise de comportamento do nosso tempo: Poema Qohelético 2: Elogio da Térmita.

Os cupins se apoderam da biblioteca
Ouço o seu áfono rumor
O canto zero das térmitas
Os homens desertaram a biblioteca
palavras transformadas em papel
os cupins ocupam o lugar dos homens
gulosos de papel           peritos em celulose
O orgulho dos homens se abate madeira roída.
Tudo é vão

a lepra dos cupins corrói o papel            os livros
o gorgulho mina o orgulho
assim ficaremos            cadáveres verminosos


escrevo este elogio da térmita.


            Retirem a mordaça imaginária que torna os livros mudos. Dei-lhes vida pondo seu próprio coração dentro de suas páginas e eles lhes devolverão igualmente a gentil ação.




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